29 de outubro de 2025
(Gregório Celso de Macêdo)
Na fatídica noite
de 29 de outubro de 1935, aconteceu no Assú uma grande tragédia, hoje
desconhecida da maioria das pessoas. Para melhor compreensão do fato, é
necessário evocar a conjuntura política da época.
O golpe de
1930 depôs os governadores dos estados brasileiros, para ao quais foram
nomeados interventores. Anos após, um dos interventores a quem o ditador
Getúlio Vargas entregou o comando do RN foi Mário Câmara. Este, embora tenha
principiado o seu comando suscitando esperanças e apregoando a concórdia e o
progresso, seguiu outro caminho e a sua administração foi fortemente marcada
por perseguições e arbitrariedades.
Já na vigência
da Constituição de 1934, foram convocadas eleições para outubro do mesmo ano,
quando o povo votaria nos deputados estaduais. Estes, por sua vez, elegeriam o
governador do estado.
No RN havia
dois partidos principais: a Aliança Social (partido situacionista) e, na
oposição, o Partido Popular, cujos adeptos eram apelidados de perrés ou
perrepistas. Realizadas, com inquietações, as eleições de 1934, surgiram
questionamentos jurídicos acerca do pleito. Tais ações ensejaram a anulação de
várias urnas no estado, provocando a realização de eleições suplementares em
1935.
No Assú, as
eleições suplementares ocorreram em fevereiro de 1935, em ambiente de muita tensão
e violência. O município foi invadido por dezenas de criminosos que coagiam,
ameaçavam, surravam e, literalmente, lixavam pessoas ligadas ao Partido
Popular, visando intimidar o eleitorado oposicionista a não comparecer às
urnas. A intenção era garantir a vitória da maioria de deputados da Aliança Social
e, consequentemente, assegurar o êxito na sucessão do governo. 
Assim, em 1934
e 1935, sob a batuta do interventor, o crime, a perseguição e a hostilidade deixaram
cicatrizes indeléveis para muitas famílias potiguares. Com efeito, apesar da
violência sofrida, os perrepistas elegeram a maioria dos deputados estaduais
(14 perrés, contra 11 adversários). Ou seja, o eleitorado não se dobrou à força
da virola e do fuzil. Passaram-se os meses em clima de intensa animosidade e
inconformismo dos aliancistas.
A eleição e a posse
do novo governador – Dr. Rafael Fernandes Gurjão – ocorreu no dia 29 de outubro
de 1935. Estava consolidada a derrota do grupo ditatorial naquela renhida disputa.
Na mesma data,
pelas 19:30h, no Assú, programadamente, deu-se início a uma manifestação
pacífica dos perrepistas, em regozijo à vitória do seu candidato. Soltavam
foguetões e se confraternizavam. Os dois pontos de encontro, muito próximos
entre si, eram os Cafés (bares) de Tipoynha (esquina com a antiga prefeitura,
onde atualmente existe a Potiguar Laboratório Ótica) e o de João Miguel
(esquina com o atual Banco do Nordeste, onde hoje funciona a Farmácia Popular).
Inesperadamente,
do prédio da antiga prefeitura, onde então funcionava o Quartel da Polícia e a
Cadeia, os fuzis da força pública, ainda servindo ao partido derrotado,
vomitaram tiros contra o povo desarmado, num ato extremo da sua sede
sanguinária e cruel.
Tombaram
mortalmente feridos dois jovens da sociedade local: Adalberto Ribeiro de Melo –
que faleceu instantaneamente – e Luís Soares de Macêdo (Lucas), que expirou meia
hora depois. As vítimas eram diretamente ligadas, por laços familiares, ao
chefe perrepista assuense, o Dr. Pedro Soares de Araújo Amorim. Tal ligação
robusteceu a tese da premeditação criminosa da mira covarde, homicida e tirânica.
Os dois jovens
mártires da democracia sucumbiram à maldade ditatorial, vítimas de um
sacrifício cívico. Naquela inditosa noite, o tradicional e altaneiro Assú,
dolorosamente ofertou, no holocausto do civismo, o seu contributo à luta contra
o totalitarismo que vergastava o Brasil e que contava com tantos cúmplices.
Adalberto e
Lucas estão sepultados no Cemitério São João Batista, no Assú. Na lápide de
Lucas está escrito: “Morto covardemente no dia da vitória do povo contra um
governo despótico”. 
Lucas teve o
nome perenizado em uma rua, por iniciativa que não partiu do poder público;
quanto a Adalberto, até onde sabemos, a homenagem ainda não foi feita. Enquanto
isso, o ditador, chefe-maior da legião, tem um busto na praça principal da
cidade das vítimas. 
Por seu turno,
muitos anos depois, um dos algozes foi nomeado delegado da cidade, por
achincalhe, certamente, de quem pretendia atingir as duas famílias enlutadas. Em
verdades, o desdouro respingou no próprio autor da nomeação. São as incoerências
entre o “Brasil real e o Brasil oficial”, das quais nos falava Machado de
Assis.
Noventa anos
se passaram do fato trágico. Que as suas almas descansem no Seio de Abraão e
que os seus compatriotas não lhes olvidem as respeitáveis memórias. Nutramos
sempre uma segura esperança que jamais a nossa terra volte a ser maculada com o
sangue de inocentes sedentos de liberdade.
 

 
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