Padre João Medeiros Filho
A humanidade está cansada de
guerras, violência, agressividade, tantos descompassos e injustiças sociais. É
preciso cuidar da linguagem, seja verbal ou não verbal. Inegavelmente, há quem
saiba cuidar bem daquilo que diz e como expressa. Infelizmente, intrigas,
discórdias, inimizades e até mortes são geradas pela incapacidade ou
inabilidade de se expressar, comunicar e dialogar adequadamente. Em todos os
campos da vida, a linguagem adequada faz viver, enquanto a inexata pode levar à
morte. Isto pressupõe saber ouvir e falar sem querer ser o centro das atenções
e muito menos o senhor da palavra. É inspirada e conhecida a frase de Exupéry:
“A linguagem é uma fonte de mal-entendidos.” Segundo alguns exegetas, a
metáfora da Torre de Babel não significa meramente a diversidade de idiomas. É a falta
de entendimento do que se fala. A essa situação alude também o salmista: “Eles
têm boca e não falam; têm ouvidos, e não ouvem” (Sl 115/113B, 5-6). Marshall
McLuhan já comentava: “Na Aldeia Global, haverá tribos com linguagens
diversas.”
É comum ouvir-se a queixa de desentendimento
entre pais e filhos, jovens e idosos, em suma, gerações diferentes. Há
verdadeiras ilhas, causadas pela linguagem humana, não apenas do ponto de vista
linguístico, mas também pelo conteúdo que se pretende transmitir. Consoante a
teologia cristã, o homem foi criado à imagem de Deus. Este é Trindade, comunhão
e interação. De igual modo é o ser humano, perfilhado por Deus pelo mistério da
graça de adoção (Rm 8, 15). Parece que a recomendação bíblica, contida no
Livro dos Provérbios, foi esquecida e desprezada: “Quem tem entendimento é
comedido no falar, rico em sabedoria e espírito sereno” (Pv 17, 27).
É salutar e gratificante,
quando se veem pessoas cultivar essa bela arte. São seres que sabem construir
pontes e não criam muros que separam. Basta uma palavra mal colocada para gerar
conflitos entre os indivíduos. E quando uma autoridade, seja civil ou
religiosa, manifesta-se sem o uso do bom senso e a preocupação em construir uma
cultura de paz, pode desencadear um estrago grande e imediato. Outrora,
cantava-se nas igrejas uma bela música, de autoria da Irmã Irene Gomes:
“Palavra não foi feita para dividir ninguém; é uma ponte, aonde o amor vai e
vem. Palavra não foi feita para
dominar, destino da palavra é dialogar; palavra não
foi feita para opressão, seu destino é a união.” Ela não deve
ser enunciada com uma carga de ameaça ou opressão, mas como ferramenta de sintonia
e encontro.
O mau uso da linguagem está se disseminando veloz e
indiscriminadamente. Muitos conflitos poderiam ser resolvidos, com diálogo cordial,
no qual ninguém se sinta dono da verdade, mas buscando compreender a diferença
e aceitar que todos têm direito ao dom da vida. Quando alguém se vê como
paladino da verdade, aniquila a possibilidade de diálogo. Isso acarreta
esfriamento na relação, que pode chegar a uma convivência insuportável,
infelizmente terminando com ruptura. Esse clima vem reinando de maneira mais
profunda e estrutural na sociedade. Grupos se organizam e tecem sua linguagem,
incapaz de ser compreendida por outros, mormente quando imbuídas de ideologias.
Costumam vir envoltas de narrativas e
sofismas com o propósito de bloquear o diálogo.
Tal fenômeno está generalizado
em todos os segmentos, inclusive nas igrejas. Verifica-se a ausência de uma
linguagem empregada por todos. Quando um líder religioso se acha autorizado a
dizer o que pensa e como pensa, sem levar em conta o essencial de sua missão –
primordialmente consistindo em favorecer a unidade e comunhão – vai criando um
clima de mal-estar, hostilidade, divisão e isolamento. As igrejas cristãs devem
educar, enfatizando o uso puro da linguagem, como sacramento e ícone do
encontro. A fala dos fariseus levava à incompreensão de Cristo, que sofreu
muitas armadilhas de seus contemporâneos. Os cristãos necessitam ter em mente
que eles são mensageiros de Cristo, o Verbo Divino. Mister se faz crescer no
aprendizado benéfico da linguagem. A alegoria narrada pelos Atos dos Apóstolos,
a respeito da vinda do Espírito Santo, deve ser seguida e vivida. Pentecostes é a resposta ao
acontecimento da Torre de Babel. “E todos se entendiam, como se
falassem sua própria língua” (At 2, 6).
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