Padre João Medeiros Filho
Há pessoas eruditas, portadoras de
títulos acadêmicos, bem-sucedidas social, intelectual e economicamente. Entretanto,
na convivência cotidiana são irritadiças, agressivas, contraditórias,
inconsequentes e imaturas emocionalmente. Não toleram críticas e são sequiosos
de elogios e bajulação. Nelas, observa-se um conflito entre o racional e o
emocional. Tais indivíduos beiram à bipolaridade e não se apercebem disso.
Quando discursam, são eloquentes e precisos. Expressam-se com lógica. Arrancam
da memória argumentos consistentes e citações apropriadas. Mas, no convívio
diário se contradizem em sua postura social. Chegam a tratar os subalternos com
indiferença, desprezo ou arrogância. Ignoram os nomes dos serviçais, tampouco
dão a todos a mesma atenção. Segundo o apóstolo Tiago, “fazem acepção de
pessoas” (Tg 2,19). E, o pior, declaram ser cristãos. Costumam mostrar-se alheios ou insensíveis
diante de alguém em situação angustiante de saúde, em dificuldade financeira,
afetiva ou psicológica. Afirma
o apóstolo João: “Quem não ama o seu irmão a quem vê, não poderá amar a Deus, a
quem não vê” (1Jo 4,20).
Certa vez, presenciei uma situação constrangedora
na postura de uma senhora culta e admirada na sociedade. Quando se preparava
para ir a um evento, não encontrou uma de suas joias favoritas (uma corrente de
ouro com um pingente de esmeralda). Após intensa procura pela casa, desconfiou
de uma funcionária – há quinze anos trabalhando ali – pressionando-a a devolver-lhe
aquela preciosidade. A colaboradora negou com veemência o “furto”. Mas, todas
as suas palavras e lágrimas foram inúteis. Nada foi suficiente para convencer a patroa de sua
inocência. Com ofensas, gritos histéricos e
xingamentos, ela foi demitida sob a ameaça de comunicação da ocorrência à polícia.
Tal fato é recorrente em vários lugares. Muitos desconhecem a recomendação
bíblica do hagiógrafo no Livro dos Provérbios: “Quão melhor é possuir a sabedoria do que o ouro, e adquirir a prudência,
mais preciosa do que a prata” (Pr 16, 16). Vale lembrar ainda as palavras do Mestre da Galileia: “Não julgueis pela
aparência. Julgai de acordo com a justiça” (Jo 7, 24).
No dia seguinte, a aludida senhora
contou o episódio à filha, que acabara de retornar de uma recente viagem à
Argentina. Perplexa, a moça reagiu: “Mamãe, o seu colar está comigo. A senhora
não se recorda de que me emprestou para eu ir ao casamento de uma amiga?” Isto
faz lembrar a admoestação do apóstolo Paulo: “Portanto, não julguemos mais uns aos outros. Em vez disso,
tomai a decisão de não pôr no caminho do irmão qualquer obstáculo ou pedra de
tropeço” (Rm 14,13).
Freud dizia que “não somos senhores em nossa própria
casa.” Referia-se à eventual impotência do eu, em relação aos instintos e
impulsos. Se o consciente é racional, o inconsciente é passional. Não é fácil
manter o equilíbrio entre razão e emoção. A primeira habita o terreno do
intelecto; a segunda, o do afeto. O desafio é evitar que a razão leve a
decisões precipitadas e a emoção provoque atos com consequências nefastas. O
ideal é não ser movido apenas por tais sentimentos. De acordo com a mitologia
grega, todos têm um lado apolíneo e outro, dionisíaco. Apolo e Dionísio eram
filhos de Zeus. O primeiro era o deus do bom senso, do equilíbrio e da razão; o
segundo, a divindade do desvario, da bebida, das festas e farras. Contudo, nem sempre é fácil dosar exatamente sonho
e realidade, delírio e sabedoria. Manter o equilíbrio é sinal de maturidade.
Às pessoas excessivamente emotivas recomenda-se sempre
parar e refletir, conter a imaginação, segurar os arroubos, tentar ver a
situação pela ótica do outro. Isso ajuda muito a não perder a serenidade e a
constância. Já aos excessivamente
racionalistas sugere-se visitar orfanatos, asilos e hospitais. Ali, poderão se
deparar com situações passíveis de despertar compaixão e sensibilidade. Deus
deseja de seus filhos sabedoria e bom senso. É clássico o pedido de Salomão a
Deus, contido no Primeiro Livro dos Reis: “Dá, pois, a teu servo um coração que
possa escutar..., capaz de discernir entre o Bem e o Mal” (1Rs 3,9).
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