Às vésperas
das eleições
Padre João
Medeiros Filho
Em breve, as eleições municipais. O descrédito de muitos
brasileiros pelos seus políticos é impactante, principalmente quando se trata de
partidos e convicções ideológicas. Eles não servem ao povo, servem-se dele. Revelam-se
incapazes de construir o bem comum. Engajar-se pela dignidade do ser humano é o
único caminho para superar o menoscabo e a rejeição pelos que cuidam da “res publica”.
Não se recupera a credibilidade com a simples presença de pessoas probas. É
preciso identificar nelas atos benéficos, que estabeleçam elementos
determinantes para o bem-estar do povo. Dom Eugênio Sales, no III Simpósio para
Pessoas de Poder Decisório, acontecido no Sumaré/RJ, dissera: “Quem se decidir
pela vida pública, não pode desprezar a pessoa humana, imagem de Deus.” E
arrematou com palavras de São Cipriano de Cartago (210-258), inspiradas no
evangelista João: “É mentira chamar Deus de Pai, quando não se tem o sentimento
de que o outro é realmente irmão.”
A Encíclica “Fratelli Tutti” indica o papel dos
autênticos líderes: “Interpretar a vontade do povo para agir em favor dele.”
Apenas lideranças qualificadas contribuem para alicerçar um projeto duradouro
de bem comum. Por isso, têm a incumbência de admitir a prioridade do ser humano,
para o qual existe a sociedade. No exercício da autêntica política exige-se o
inegociável propósito de discussões honestas, buscando verdadeiramente defender
causas legítimas e justas. Os homens públicos devem orientar-se pelos direitos
e necessidades da população, outorgante e mandatária legítima de seus poderes.
Importa
nessa perspectiva que os interesses partidaristas sejam relativizados. É
imprescindível que os atores políticos estejam sempre imbuídos de honestidade
material e intelectual, colocando em plano secundário as preferências meramente
ideológicas. A política é válida, se construir uma comunidade justa, fraterna e
solidária. Desvia-se de seus objetivos, quando propostas e atos contemplam
prioridades de grupos. Da mesma forma, é deturpada ao se governar apenas para
os sequazes. A consequência é o favorecimento de poucos, sobrando à maioria migalhas
e sobejos. Não se tem conseguido penalizar aqueles que exploram,
amesquinham e perseguem o povo, colocando vidas em risco pela desassistência e
submissão a situações vis, análogas à escravidão.
Tudo
o que fere o bem comum é desumano e anticristão, negando peremptoriamente a
natureza da política. Merece atenção especial a desigualdade social no Brasil
com seus vergonhosos e degradantes cenários para a cidadania. Gera exclusão e
aprisiona os cidadãos com preconceitos e discriminações. O populismo insano é
outra ameaça deletéria. Quem o pratica, busca atrair adeptos para massificar o
povo. É aviltante, pois coisifica o indivíduo. Atualmente, fala mais alto o
projeto pessoal de permanência ou volta ao poder. Esta é a tônica de vários
candidatos. É muito grave, quando esse populismo favorece inclinações ignóbeis
de grupos e facções. Detestável ainda é tentar submeter instituições e
indivíduos ao servilismo. O candidato integro permanece aberto a críticas
construtivas e mudanças autênticas, enriquecedoras para o homem.
Governantes e legisladores detêm a responsabilidade de
oferecer às pessoas meios para sua realização como criaturas humanas. Por isso,
é necessário aniquilar os contrastes. Os que estão no poder não estão
autorizados a renunciar ao indispensável desafio de ajudar a construir um
modelo de sociedade. Esta tem o dever de assegurar a todos o direito ao
exercício da cidadania, partindo de suas peculiaridades. Há quem pense que ser líder
é calar, manipular, “lacrar” e destruir os outros. Aqueles que se dedicam à
vida pública são chamados a novos aprendizados para reconstruir a Pátria. “A
política bem exercida é a forma mais alta da caridade”, afirmava Pio XI,
seguido pelos últimos papas. Quem a exerce terá de se imbuir dos ensinamentos
bíblicos: “Ninguém busque seu próprio interesse, mas o do outro” (1Cor 10, 24).
Os municípios estão nas mãos dos eleitores. Às igrejas cabe unir e não dividir.
Aos pastores a tarefa de respeitar, iluminar e nunca aliciar. Neste final de
campanha eleitoral, mister se faz que os cristãos reflitam muito e supliquem a
Deus pelos futuros eleitos, responsáveis pelos destinos de nossa gente. É
preciso que saibam “conduzir o povo com justiça e equidade” (Is 32, 1), “pois
quando os justos são maioria e governam, o povo se alegra” (Pr 29, 2).
Nenhum comentário:
Postar um comentário