Padre João Medeiros Filho
A morte necessita ser aceita, com menos dor e tristeza, mais
resignação e resiliência. Tal realidade, passível de demora e sofrimento,
depende da estrutura emocional e da crença de cada pessoa. Cabe-lhe o direito
de escolher o caminho mais reconfortante, decorrente de sua fé ou
espiritualidade. Para uns, quem morreu se reintegrou à mãe natureza. Segundo outros,
reviverá nos filhos, netos etc. Muitos asseguram que cada ser humano fará parte
de uma energia maior, penetrando noutra dimensão. O cristianismo ensina que a
morte é o início da vida em plenitude, a porta de entrada no definitivo, “a
aurora da eternidade”, na expressão de Dom Nivaldo Monte. Roberto Carlos, em
sua fase mística, manifesta a sua crença: “Além da vida que se tem,
existe outra vida além – e assim o renascer – morrer não é o fim.”
A vida flui, realizando os ciclos da existência. Estes
abrem-se e fecham, tal é o existir. Isso ajuda a pensar nas vezes em que alguém
se mostra egoísta, desonesto, hipócrita e injusto. Mas, deve-se lembrar
igualmente os momentos em que se pratica o Bem. As águas do fluir da vida não
se interrompem, quando se dorme ou come, nos momentos de tédio, depressão e
ansiedade, no choro copioso na solidão do quarto ou na escuridão da noite. “A
morte é natural, pois faz parte da realidade biológica. Comer, beber, dormir,
sonhar, procriar e morrer integram a natureza humana.” Palavras do meu saudoso
médico Dr. Leônidas Côrtes, diretor geral da Casa de Saúde São José, situada no Bairro
do Humaitá, Rio de Janeiro (RJ).
O intervalo da vida e os instantes de seu fim são um duro
e exigente aprendizado. E disto poucos cuidam. Não se pretende abordar aqui as
tragédias em acidentes e assassinatos. Entretanto, é impossível esquecer que no
Brasil morrem mais pessoas de violência do que em muitas guerras. Trata-se da
banalização da morte e espantosa desvalorização da vida. É importante dizer que
“A Moça Caetana”, na expressão de Oswaldo Lamartine, ou a “Indesejada das gentes”,
conforme Manuel Bandeira, é dolorosa e de difícil aceitação para muitos. Os cristãos
convictos afirmam que somente a fé amaina a tristeza e a dor da separação.
Quando jovem sacerdote, em Caicó, lá se vão seis décadas, um
menino me indagou na sua simplicidade, diante do ataúde de seu avô: “Padre,
para onde foi vovô?” Respondi, da maneira mais natural possível: “Ele viajou
para perto de Deus. Vai cuidar melhor de você, pois terá mais tempo. Guarde-o
bem em seu coração...” Falar é fácil –
dizia a mim mesmo – enquanto comentava isso com a criança. O drama da vida não
se encerra com o choque do falecimento. Nesse instante, começa uma segunda
indagação. Na primeira, questiona-se qual é o sentido da existência, a razão do
que se faz no mundo, o significado dos encontros, desencontros, realizações, frustrações
etc. Diante da perda de alguém, interroga-se: “qual o sentido daquilo que
muitos pensam ser o fim? E quando chegar a nossa vez?” Em geral, tem-se muito ou
pouco medo, dependendo da fé.
Vale
recordar a frase atribuída a Sócrates – condenado à morte pelos cidadãos de
Atenas – proferida na hora de beber a cicuta: “Se a morte é um sono sem sonhos,
será bom. Se for um reencontro com pessoas amadas que partiram, será melhor
ainda. Então, não se desesperem tanto.” Se alguém que não conheceu a ternura de
Jesus, falava desse modo, quanto mais os cristãos, que acreditam nas palavras
do Mestre: “Eu sou a Ressurreição e a Vida. Quem crê em Mim, ainda que tenha
morrido, viverá” (Jo 11, 25). É preciso tempo para integrar à vida a dimensão
da morte. Mesmo sem falar em eternidade, não se pode negar que os mortos queridos
vivem em nós, ao lembrar seus rostos, vozes, gestos, risos, os belos e difíceis
momentos vividos. Repetem-se no milagre genético, nos filhos e netos, ou se
perpetuam pela lembrança. Isso não é tudo. Para quem segue Cristo
verdadeiramente encontrará resposta e consolo. “Ele enxugará toda lágrima de seus olhos, não existirá mais morte, não haverá
mais luto nem dor” (Ap 21,4).
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